Floriano Serra *
Alguns leitores já devem ter percebido que, quando por alguma razão certos clientes de prestadores de serviços se sentem contrariados, não hesitam em dar mostras públicas do seu poder e soltam pérolas como:
— Eu estou pagando! Então exijo que seja feito assim!
Nestes casos, é de se acreditar que a posse de dinheiro não seja proporcional à posse da boa educação. Infelizmente, em algumas famílias, também existe a presença de frases que pretendem deixar claro quem é que manda no pedaço:
— Enquanto você viver às minhas custas, as coisas aqui vão ser do jeito que eu quero!
— Enquanto você viver às minhas custas, as coisas aqui vão ser do jeito que eu quero!
Em um grande número de empresas, guardadas as devidas proporções e contextos, ocorrem situações análogas àquelas: como elas pagam os salários e concedem os benefícios, o empregado tem que se submeter a condições e práticas nem sempre profissionais e saudáveis, como atestam os recentes e inúmeros casos de assédios, “burnouts” e “bullyings” que a imprensa vem divulgando.
Nesses exemplos, há um lamentável e elementar erro de interpretação do significado e do objetivo do chamado poder econômico. Não custa lembrar que a finalidade desse poder não é impor nem obrigar pessoas a fazerem o que não querem ou algo que contrarie suas condições, seus valores e seus direitos. Aliás, para conseguir isso ninguém precisa de poder econômico: basta um ultrapassado chicote – ou chibata — usado farta e desumanamente no tempo da escravidão.
O poder econômico também não existe para comprar corpos, consciências, corações e mentes – numa organização, essas coisas não estão à venda, mas estão à inteira disposição de quem as convide para trilhar o caminho da ética, da justiça, da legalidade, do Bem. Estes comentários pretendem convidar determinados profissionais para uma reflexão sobre uma premissa óbvia, mas nem sempre observada: o poder que emana do dinheiro – seja na forma de pagamento, mesada ou salário – não dá a nenhum tipo de liderança o direito de, sob qualquer pretexto, comprometer a qualidade de vida e a auto-estima dos liderados.
A propósito deste assunto, permitam-se transcrever uma frase admirável, atribuída a certo Ed Liden, sobre o qual não tenho maiores informações, mas que certamente sabia o que dizia em matéria de gestão de pessoas: “Pode-se comprar o tempo de um Homem. Pode-se comprar a presença física de um Homem em determinado lugar. Pode-se até mesmo comprar um número exato de habilidosas ações musculares por hora e por dia. Mas não se pode comprar entusiasmo. Não se pode comprar espírito de iniciativa. Não se pode comprar lealdade. Não se pode comprar a dedicação do coração, da mente e da alma. Essas coisas você tem que merecer.”
Em resumo: o poder econômico que não conduz as pessoas à felicidade, não merece o nome de poder.
Talvez chicote - ou chibata.
Floriano Serra é psicólogo, palestrante e docente de seminários comportamentais. É diretor-executivo da SOMMA4 Gestão de Pessoas, autor de vários livros e inúmeros artigos sobre o comportamento humano no trabalho. Ex-diretor de RH de empresas nacionais e multinacionais.
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